Qual é a vantagem de estar num país tão longínquo como a Argentina? Obriga as pessoas a serem criativas. Também existe a distância no tempo: faz agora 100 anos que a escola Waldorf foi fundada. É um tesouro que nos foi dado. Podemos esconder este tesouro e devolvê-lo estagnado, ou podemos torná-lo mais fértil de tal forma que cresça em algo maior do que aquele que recebemos.
Como podemos manter hoje o movimento Waldorf vivo e frutificador, em qualquer contexto? Manter algo significa «preservar», mas o movimento necessita de constante interação com o mundo em redor, e esse está constantemente a transformar e a ser transformado. O que precisamos de preservar e o que precisamos de transformar de forma a manter o impulso antroposófico vivo? O impulso espiritual tem de se manter espiritual; não pode mudar. As condições históricas e culturais, pelo contrário, não são mais as mesmas.
Para todas as crianças
Vemos o gesto criativo de Rudolf Steiner em 1919, quando ele estava ativo a partir da situação social de então. Este gesto tem de ser alimentado e preservado. E, no entanto, se apenas imitarmos a primeira escola Waldorf, acabaríamos por nos tornar em pálidas cópias. Ao adotarmos este gesto criativo, temos, de acordo com Rudolf Steiner, de dialogar com a legalidade vigente, com o mundo académico e com a realidade social.
A primeira escola Waldorf foi fundada para filhos de trabalhadores; hoje não encontramos necessariamente filhos de trabalhadores nas escolas Waldorf. Temos de nos assegurar que o melhoramento da Escola Waldorf não acontece num meio fechado e que o impulso espiritual pode tornar-se fértil para qualquer criança.
No nosso trabalho com a Educação Waldorf na Argentina temos três calcanhares de Aquiles: no âmbito cultural a nossa língua interna não se adaptava ao discurso científico; na nossa relação com as autoridades, tivemos que continuamente pedir exceções legais para poder manter a nossa liberdade educacional; no âmbito social, focámo-nos durante décadas num grupo particular – privilegiado e homogéneo – e, consequentemente, negligenciámos outros grupos no país. No fundo não seguimos o impulso da tripartição nas três esferas da sociedade.
Adaptando-nos às condições
Procurámos estabelecer contactos com as autoridades e olhar para os programas de formação de professores com a intenção de os complementar com visões da antroposofia de modo a que estas estivessem ao dispor de qualquer professor. Por exemplo, não insistimos em não ensinar Geometria a crianças muito pequenas porque é muito intelectual, mas se o governo exige que o façamos, então realizamo-lo adaptando à idade da criança.
Os professores jovens e os professores em formação no nosso instituto oficialmente reconhecido estão motivados para trabalhar a partir da antroposofia. Eles não encontram situações ideais mas têm de lidar com os desafios que vão encontrando e adaptar o seu trabalho a cada situação. Com esta abordagem esperamos sermos capazes de sair do nicho de uma educação alternativa – porque esse é um nicho de auto-defesa, onde os tesouros acabam por ser protegidos de qualquer contaminação: um perigoso lugar de pureza, perfeição e estagnação.
Quando doarmos este tesouro como uma dádiva, não se diluirá, mas tornar-se-á na semente de mudança e transformação cultural. Estudar e interiorizar a antroposofia não é uma meta mas o fundamento. A meta está no futuro – e o futuro está algures no mundo.
Alejandro Ranovsky, é professor de ensino primário, investigador e formador em educação secundária e em filosofia na Universidade de Buenos Aires. É co-fundador do Instituto de Formação de Professores Perito Moreno, onde também dá formação.
In Anthroposophy Worldwide, 5/2019, tradução de Leonor Malik